O
CEMITÉRIO SECULAR DE CAMPOS
Pedro
Paulo Paulino
O
cemitério de Vila Campos tem um século e alguns anos mais de existência.
Durante decênios funcionou como destino último quase exclusivo da gente do
lugar e só de tempos a tempos testemunhava um funeral. Reduzido e muito
simples, foi construído em terras de Júlio Paulino Gomes, coração dos mais
humanitários que já vieram a este mundo e hoje ali ‘descansa dessa longa vida’.
A conservação da velha necrópole ficava também sob seu encargo filantrópico,
afora outras ações próprias de um benfeitor.
Mas
o tempo rege também a cidade dos mortos. Com o correr dos anos o cemitério de
Vila Campos ganhou status de necrópole regional, as paredes que o cercam foram
empurradas de um canto para outro em busca de mais espaço e agora se vê ali a
realização de enterros com uma frequência inusitada. Mais de uma vez já
sucederam até dois ou três sepultamentos num só dia. Em contrapartida, o
mutirão de limpeza do campo-santo ajunta sempre dezenas de mãos solidárias.
Outro
sinal do crescimento é visto nas fileiras de jazigos de concreto, alguns tão
vistosos que parecem moradia dos vivos. O que era há poucos anos um amontoado
de covas humildes e cruzes toscas transformou-se num labirinto de construções
fúnebres. Até a cal dos sepulcros singelos deu lugar à cor viva do mármore.
Na
multiplicidade de túmulos que compartilham aquele território encontram-se os
jazigos dos Paulino, dos Secundino, dos Ferreira, dos Sousa... Ali repousam
meus avós e bisavós. Gerações e gerações, no meio das quais – o fato é tanto
curioso quanto lastimável – ninguém gravou até hoje um único epitáfio!
Anexa ao cemitério ergueu-se próximo do portão
a capelinha de Nossa Senhora da Piedade, uma conquista recente que também
demarca o grau de progresso do patrimônio. Antes de sua existência, a missa de
corpo presente era oficiada na capela de São Roque, em cuja nave o esquife era
colocado sob o olhar vidrado do padroeiro. Porém, com a concorrência do novo
templo convencionou-se de bom grado que em Vila Campos São Roque cuida dos
vivos e Nossa Senhora da Piedade responde pelas almas.
No
Dia de Finados o cemitério de Vila Campos acolhe visitação constante. De
lugares diferentes o povo aflui para cumprimentar com rezas as suas almas
queridas. Da minha janela, à pouca distância avisto o vaivém. E contra a
brancura da amurada lúgubre vejo bater a luz alegre da manhã, revelando que ali
dentro, nesse instante, há mais sinal de vida do que fora.
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