MANDACARU,
O GIRASSOL DO SERTÃO
(Pedro
Paulo Paulino)
Entre
as imagens mais atraentes da natureza, existe uma que eu vi no meu quintal numa
manhã de abril deste ano: a floração do mandacaru. As flores brancas e puras se
abriram ao longo dos pés do cactos, à semelhança de girassóis espalmados,
acenando para a luz do dia. Logo uma multidão de abelhas e outros insetos
rondavam aquelas pétalas voluptuosas cheias de néctar e beleza. Depois os
colibris e outros passarinhos cortejavam alegres as mesmas flores, numa orgia providencial,
de vez que toda essa fauna é responsável, entre outras coisas, pela proliferação
do mandacaru dentro da caatinga.
Afora
o vento, os insetos e os passarinhos parecem ser os únicos
seres privilegiados por tocar na brancura e no tecido imaculado das flores do
mandacaru.
Guarnecendo
cada pétala, fileiras e fileiras de espinhos altivos, como um exército
invencível, perfilam-se e protegem-nas como se protege um tesouro. Mesmo assim,
por uma ordem natural, a flor do mandacaru ostenta seu encanto raro por apenas
algumas horas. É comum desabrochar na madrugada e se recolher em si mesma com os primeiros raios de sol.
A
floração termina aí e só se repetirá em outro ano. Esse espaço curto de tempo
constitui um luxo na paisagem sertaneja. A propósito, na concepção do homem do
campo a floração do mandacaru está ligada à chegada da chuva, mesmo na estação
mais desanimadora em que se transforma a seca. Por isso mesmo, o mandacaru
inspirou uma das cantigas mais conhecidas de Luiz Gonzaga.
Ereto
como colunas de um templo, os pés de mandacaru nascem, crescem e sobrevivem nos
lugares mais inclementes, até mesmo sobre as rochas, telhados e muros. Conheço
um que se equilibra no caule de uma algarobeira, vindo a ser o que os botânicos
chamam de planta epífita.
Geralmente
esses arbustos vivem isolados uns dos outros, como se fossem monolitos
vegetais.
Para
o semiárido, o mandacaru é um símbolo tal como o juazeiro. Na seca, é o aliado
mais forte dos pequenos criadores. Levado ao fogo para eliminação dos espinhos, o
mandacaru transforma-se em refeição salvadora do gado.
Nem
mesmo a canícula mais devastadora embota o verde do mandacaru, que nos extremos
da sequidão torna-se de um verde mais pujante ainda, como que se vingando do
sol. E assim, em dado período do ano se transforma no mais varonil dos vegetais
da caatinga, para em outra quadra ornamentar invejavelmente a paisagem com suas imensas flores brancas.
Foi
num desses instantes, que em abril deste ano fotografei o pé de mandacaru do
meu quintal. Ele amanheceu soberbo de flores. E minha
sensação diante de tal espetáculo foi compartilhada milhares de vezes na
internet por aí afora.
Nem
todos somos míopes com a Natureza.
Parabéns, Pedro, sua crônica é soberba. Você juntou romantismo, sensibilidade, poder de observação e erudição com simplicidade, de uma forma lírica, capaz de dar prazer a qualquer pessoa que sinta prazer em ver o belo.
ResponderExcluirNa Semana Santa fui ao mosteiro dos jesuítas em Baturité. Fica a uns 400 m de altitude, é um pouco frio mas há uns cactos grandes no jardim que dão um fruto bem vermelho, parecendo um jambo. Será o mesmo mandacaru? Cheguei até a fotografá-lo.
Flávio Henrique
Obrigado, Flávio. Certamente o tipo de mandacaru serrano que você viu e fotografou é o mesmo do nosso sertão. A floração resulta em frutos encarnados. Abçs.
ResponderExcluirPedro.