quarta-feira, 24 de agosto de 2011

poesia matuta


Um dos poemas matutos mais cheios de gracejo é de autoria de Zé Laurentino. Quando no jargão do futebol, goleiro ainda era keeper e havia o foot-back, ele escreveu:

MATUTO NO FUTEBOL

Hoje, o pessoal do mato
Já ta se acivilizando
Já tem rapaz estudando
Pras bandas da capitá
Já tem moça que namora
Com o imbigo de fora
Ediceta, coisa e tá

Mas essas coisas eu estranho
Me dano e nao acompanho
A tá civilização
Inté que a morte me mate
Nunca fui numa buate
Nunca vi televisão

E esse tá de cinema
Eu nao sei nem como é
Se é homi, se é muié
Se veio da lua ou do só
Um triato eu nunca vi
E também nunca assisti
Um jogo de futebó

É isso mermo, patrão
Eu nasci pra ser matuto
Viver que nem bicho bruto
Dando de cumê a gado
Eu só acho que sou gente
Pruquê um véi meu parente
Disse que eu sou batizado

Mas, por arte dos pecados
O filho de cumpade chico
O fazendeiro mais rico
Dali daquele arrebó
Com preguiça de estudar
Inventou de inventar
Um jogo de futebó

E no paito da fazenda
Mandou botar duas barras
E eu fui assistir a farra
Do lote de vagabundo
Mas, quando vi, afrouxei
Acredite que achei
A coisa mió do mundo

Eu, cabôco lazarino
Com dois metro de artura
Os braço dessa grossura
Medo pra mim é sulipa
De jogar tive um parpite
E aceitei o convite
Prumode jogar de quipa

Me deram um calção listrado
E um par de jueiêira
Tambem um par de chuteira
E uma camisa de gola
Aí, gritei: arre diabo
Eu já peguei touro brabo
E segurei pelo rabo
Pruquê num pego uma bola?

Sei que o jogo começou
O juiz bom e honesto
Pra começar, era Arnesto
O nome do apitador
Que, metido a justiceiro
Prumode o jogo parar
Bastava a gente chutar
A cara dum companheiro

Bola vai e bola vem
Um tá de Zé Paraiba
Inventou de dar um driba
No filho de Xica Brejeira
Esse deu-lhe uma rasteira
Que o pobre do matuto
Passou uns cinco minuto
Se embolando na poeira

O juiz mandou chutar
Uma bola contra eu
Pruquê meu fubeque deu
Um coice no Honorato
Aí o juiz errou
Pruque se outro chutou
Ele que pagasse o pato

Mas, afiná, meu patrão
Não gosto de confusão
Mandei o cabra chutar
Fiquei esperando o choque
Tanta força a bola vinha
Que vinha pequenininha
Que nem bala de badoque

Quando eu fui pegar a bola
Me atrapaiei, meu patrão
Passou pru entre meus braços
Bateu numa região
Que foi batendo e eu caindo
Espulinhando no chão

O povo caiu em riba
Me deram um chá de jalapa
Uns três copos de garapa
Mais um chá de quixabeira
Quando tive uma miora
Joguei a chuteira fora
Saí batendo a poeira

E desse dia pra cá
Nem mode ganhar dinheiro
Não jogo mais de goleiro
Nem com chuva nem com só
Nem aqui nem no deserto
Nunca mais passo nem perto
Dum jogo de futebó

Um comentário:

  1. Excelente... O autor foi muito fiel ao descrever um jogo no interior!

    Abraços PPP
    Sidney Dias

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