terça-feira, 16 de setembro de 2014

O HERÓI DO SERTÃO

(Zé Laurentino)


Conheci Pedro Tomaz
Na fazenda do Estreito.
Caboclo trabalhador,
Respeitador e direito.
Há muito tempo eu não via
Um cabra daquele jeito.

Na cartilha de seu Pedro
Não tinha o nome preguiça,
Só deixava o seu roçado,
Domingo, pra ir à missa.

Minhas palavras são pobres
Para pintar seu retrato:
Tinha dois metros de altura,
Ligeiro que só um gato;
Pesava mais de cem quilos,
Era um Maguila do mato.

Casaco com Minervina,
Filha de seu Virgolino,
Aquele casal bonito,
Unido, quase divino,
No espaço de dois anos
Fez um casal de menino.

No ano sessenta e dois,
Eu ainda estou lembrado,
Que Pedro Tomaz, sozinho,
Fez um esforço danado.
Brocou, queimou e plantou
Oito quadros de roçado.

Mas o sol quente, danado,
A seca avassaladora
E a lagarta acabaram
Com toda a sua lavoura.

Às quatro horas da tarde,
Quando o sol da cor de guerra
Incendiava o sertão,
Do baixio até à serra,
Seu Pedro Tomaz sentia
Seu sonho cair por terra.

Tanto suor derramado
Por cima daquele chão,
O nosso herói contemplava
Os calos de cada mão
E um desgosto profundo
Batia em seu coração.

Tomou uma decisão:
Ir ao Rio de Janeiro
Arranjar algum trabalho,
Conseguir algum dinheiro.

Em cada menino, um cheiro
E um abraço comovido.
Minervina soluçando
No ombro do seu marido.
Não sei se era soluço,
Não sei se era gemido
De um peito apaixonado
Pelo desgosto partido.

Na velha rodoviária,
O lenço branco acenando,
O carro dando partida,
Os dois meninos chorando,
E Pedro Tomaz partindo
Pra voltar, quem sabe quando!

Com quatro dias depois,
O nosso Herói do Sertão
Desembarcava no Rio,
Com a mala velha na mão
E a saudade dos filhos
No fundo do coração.

O dinheiro que levara
Gastara todo na estrada...
E haja procurar emprego,
Mas qual emprego, qual nada!
Comia quando pedia,
Dormia pela calçada.

Depois de quase dez dias,
Sem um trabalho encontrar,
Falou com o dono de um circo,
O palhaço Baltazar.

Baltazar olhou pra Pedro
E disse: – cabra da peste,
Tem serviço pra você,
Mas primeiro tem um teste.

Tá vendo aqueles três quartos?
Pedro respondeu: – Estou.
– Pois o teste é o seguinte –
E a ensinar começou.

– Naquele primeiro quarto,
Que está em sua frente,
Em cima de uma mesa
Tem um litro de aguardente.
Você bebe a pinga toda,
Não deixa um pingo somente.

Naquele segundo quarto
Encontra-se uma coroa,
Uma velha de setenta
Mas ainda muito boa.
Você faz amor com ela
Que de muito vive à toa.

Então no terceiro quarto
Tem uma onça pintada,
Você pega a mão da onça
E cumprimenta a danada.

Pronto, vá fazer o teste,
Se der conta do recado,
Daqui a mais um hora
Você já está empregado.

Falou e saiu sorrindo,
Com a maior gozação,
Enquanto Pedro Tomaz,
O nosso Herói do Sertão,
Já partia humildemente
Pra cumprir sua missão.

Entrou no primeiro quarto,
Pegou o litro e a taça,
Bebeu sem fazer careta
Todo o litro de cachaça.

Já saiu puxando fogo,
De cabeça meio sonsa.
Errou o quarto da velha,
Entrou no quarto da onça.

Com meia hora depois
Saiu todo ensangüentado.
O palhaço, quando o viu,
Quase que cai espantado.

E Pedro Tomaz sorrindo,
Todo cheio de lorota,
Disse: – Eu já comi a onça,
Só tá faltando a velhota.

O palhaço disse: – Moço,
Tu és um cabra danado,
A partir deste momento
Estás por mim empregado.

O grande Pedro Tomaz,
Caboclo forte da peste,
Mandou buscar a família
Que deixara no Nordeste
E ainda hoje trabalha
Grande circo Everest.

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