domingo, 23 de março de 2014

RELEMBRANDO CANINDÉ


Erivaldo Façanha*

Podemos até reconhecer a idade das pessoas por suas expressões idiomáticas ou mesmo pela gíria que usam. Hoje, as palavras que corriqueiramente usamos sofrem muita influência da televisão. Antigamente, quando ouvíamos um sulista falar, achávamos suas expressões diferentes das nossas. Hoje, não, a televisão é pessoa de casa. Ela nos faz falar como cariocas ou paulistas.
Mas há expressões que são somente nossas. Exemplos: “barriga de soro azedo” (indivíduo barrigudo, meio moleirão), “seca do quinze” (indivíduo magro, raquítico), “furão” (cara ruim no futebol), “furar a jogada” (quando se erra o chute), “cabeleira de macaco” (camarada que usava o cabelo todo para trás, na base da brilhantina), “Tarzan” (indivíduo musculoso, forçudo). Havia também o apelido de “Hulk”, devido ao seriado de televisão.
Há muitas outras palavras que pertenciam à minha época de criança e se perderam no tempo, saíram do linguajar do povo. Mas tem uma palavra que é natural de Canindé, segundo o folclorista Filgueira Sampaio que foi professor muitos anos no Colégio São Francisco. É “saboga”, sinônimo de rapadura ruim. Saboga é o nome de um peixe comum nas costas brasileiras. Mas os alunos do antigo Colégio São Francisco apelidaram de saboga a rapadura meio salgada, não muito apetitosa, mas que, no lugar de outra melhor, servia de sobremesa ou merenda. Rapadura desse tipo era só o que tinha originada dos engenhos nas redondezas de Canindé.

“Amarelo empambado” se dizia pejorativamente do indivíduo e “barata descascada” do sujeito muito alvo. “Tiro seguro” era o purgante, na base do azeite de mamona que as mães abnegadas da minha época usavam para expulsar tudo que era verme, no lugar dos vermífugos modernos mais eficientes. Ficava o sujeito trancafiado num quarto, na boca o gosto ruim de óleo de rícino, todo encolhido dentro de uma rede. Sempre tinha alguém que botava a cabeça na porta e perguntava: “Já fez efeito?” Se não, tinha que tomar outra intragável dose. Mas quando o efeito vinha, o cabra tinha que estar preparado para correr ou teria de tomar um banho completo, mesmo purgado.

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*Odontólogo e escritor.

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