NOSSA SINGELA HOMENAGEM
A FREI LUCAS DOLLE
Augusto Cesar Magalhães
“Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma
partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o
mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a
casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me,
porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos
dobram; eles dobram por ti.”
Esta antiga reflexão filosófica sobre a morte, que foi
escrita pelo poeta inglês John Donne, ainda no Século XVII, ganhou ares
cosmopolitas quando, em 1940, o escritor norte-americano Ernest Hemingway,
escreveu o romance “Por quem os sinos dobram”, que virou Best-seller.
A trágica morte de Frei Lucas trouxe um profundo
sentimento de pesar a comunidade canindeense, ficamos na orfandade de um líder
carismático, um grande benfeitor que durante 21 anos esteve à frente da nossa
Paróquia.
Uma das lembranças mais marcantes da minha infância que ainda
hoje guardo em vivas tintas se deu aos sete anos de minha idade, quando eu era
aluno do antigo Grupo Escolar Monsenhor Tabosa e fomos trazidos em fila
organizada, tendo à frente a nossa diretora e ladeados pelas professoras, com
um bando de penitentes rumo a Basílica de São Francisco.
Naquela época quase não existia o trânsito de veículos e
assim saímos pela Tabelião Facundo e descemos o alto pela Travessa Severiano
Martins até chegar a Rua Joaquim Magalhães, onde foi anunciada a mudança de
roteiro. Em vez de dobrar para a Basílica, seguimos em frente até uma rua
diagonal, atualmente tomada pela Praça Frei Aurélio. Dita rua se iniciava na
residência do Sr. Cesar Campos e ia até o Convento de Santo Antônio.
Nossa inocência não permitia raciocinarmos que estávamos
sendo conduzidos para ter o privilégio de um testemunho histórico, presenciar a
chegada daquele homem que foi um marco divisor na história desta cidade. Nós
apenas sabíamos que íamos recepcionar o novo vigário e que seu nome era “Frei
Lucas”.
Lá veio ele, desceu do carro próximo a criançada e saiu
afagando rostos sorridentes e cabeças levantadas fuzilando-o com os olhos com
comovente admiração. Seu sorriso era tímido, todavia, sincero e cordial. Mais
na frente podíamos divisar os membros das irmandades religiosas (Vicentinos e
Filhas de Maria), as autoridades e as pessoas mais proeminentes da minúscula
Canindé.
Com seu espírito dinâmico e com seu carisma, Frei Lucas em
pouco tempo encantou a todos, com harmonia e respeito mútuo. Foram muitos os trabalhos
por ele desenvolvidos em obras sociais na paróquia, tendo como maior destaque a
implantação, coordenação e manutenção do Hospital Regional São Francisco, as
expressivas ajudas ao Curso Profissionalizante Santa Clara, dirigido pela
bondosa Irmã Silvina (hoje falecida), bem como a Legião Brasileira de
Assistência – atualmente desativada. Introduziu expressivas reformas no Abrigo
dos Romeiros, Casa Paroquial, Ex-votos, Museu e manutenção de todo o complexo
religioso de Canindé. Construiu também o gigantesco prédio do Centro
Educacional São Francisco (CNEC), com verba arrecadada na Alemanha.
Muito prestigiado pela classe política, utilizou
eventualmente deste prestígio em benefício da sociedade e nunca em proveito
próprio. Em 1976, na Festa de São Francisco, no exato dia do padroeiro (4 de
outubro), pediu ao então governador do Estado, Coronel Adauto Bezerra, a
construção de uma estrada estadual ligando Canindé a Santa Quitéria para
facilitar principalmente o deslocamento de romeiros do Piauí e Maranhão,
encurtando a viagem em condições mais favoráveis. Tendo como testemunha
milhares de romeiros que se comprimiam em frente a Basílica, recebeu de viva
voz a promessa do governador e bem antes da Festa o ano seguinte a estrada era
inaugurada com o nome de Rodovia Presidente Geisel.
Da mesma forma pode se dizer em relação a Praça do Romeiro
que foi uma promessa do então candidato a governador, Tasso Jereissati, de
forma mais reservada, que caso fosse eleito construiria um espaço religioso
ocupando todo o terreno contíguo ao Convento. No ano seguinte foram iniciadas
as obras do que hoje chamamos de Praça do Romeiro e hoje seria impensáveis os
eventos religiosos na meca franciscana sem aquele espaço privilegiado.
O certo é que cada ser humano que parte no bonde da
eternidade leva consigo uma fatia da história, na exata proporção da sua
atuação no palco da vida. Frei Lucas foi exponencial, o palco da vida foi
pequeno pra ele, talvez por isso Deus o chamou.
Os sinos não dobraram por ele, segundo as justificativas,
no período que compreende a quaresma os sinos não tocam. Quando passar esse
período e os sinos voltarem a dobrar não serão mais por ele, mas por cada um de
nós, afinal, com a morte desse gigante benemérito, cada um de nós morre um
pouco também.
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