terça-feira, 1 de janeiro de 2013


A SECA E OS POETAS



A seca no Nordeste brasileiro tem sido tema freqüente na inspiração dos poetas populares. Um dos poemas mais eloqüentes de Rogaciano Leite, por exemplo, é “Os flagelados”, de 1956. Patativa do Assaré ganhou fama decantando os dramas dos conterrâneos cearenses com as sucessivas secas. Um de seus trabalhos mais conhecidos é a canção “A triste partida”, sucesso até hoje na voz de Luiz Gonzaga. O retirante, a catinga tostada, o porão dos açudes rachado pelo sol, as aves que migram em busca de água e comida, caveiras de boi no campo estéril são alguns dos retratos explorados pelos cantadores e compositores sertanejos. No último dia de 2012, o poeta repentista Geraldo Amancio Pereira, chocado com o drama de mais uma seca prolongada no Ceará, postou em seu Facebook essas décimas: 

“Do tempo sobe o mormaço,
Do sol as chispas mais quentes
Parecem tições ardentes
Incendiando o espaço,
Ou picaretas de aço
Que descem rachando o chão,
Deixando em cada rachão
Os rastros do desespero:
Se não chover em janeiro
Vou embora do sertão.

A nuvem passa e não vasa,
Se vê na seca inclemente
Casa ficando sem gente,
Gente ficando sem casa.
Voa a formiga de asa
Assombrada com verão,
Escasseia a refeição
Do peba no formigueiro:
Se não chover em janeiro
Vou embora do sertão.

Por fome que o filho sinta,
Com grito e com choromingo,
De leite não sai um pingo
Dos seios da mãe faminta.
Um quadro que a fome pinta
Com tintas da precisão,
Onde entra inanição,
De leite não tem nem cheiro:
Se não chover em janeiro
Vou embora do sertão.”


Já o poeta Wanderley Pereira foi mais otimista e advertiu:

“Chuva, trovão e corisco,
Mata verde e rio cheio
Vamos ter porque eu creio
Em Deus e em São Francisco.
O Orós chega no risco
Do cume do paredão,
Vai encher o Castanhão,
Roncar forte a cachoeira,
E até Wanderley Pereira
Vai voltar para o Sertão.” 


Na mesma pisada, o cordelista Pedro Paulo Paulino disse:

“Eu que no sertão já vivo
Desde quando aqui nasci,
Inverno e seca eu já vi
Neste meu torrão nativo.
Só não sei por qual motivo
Existe essa confusão
Entre seca e inundação,
Num troca-troca freqüente:
Haja seca ou haja enchente
Eu não deixo o meu sertão.

No ano dois mil e nove
Choveu acima da média,
Mas de repente a tragédia
Se repetiu e não chove.
A seca mata e comove,
Chupa as águas, tosta o chão,
Desnuda a vegetação,
Porém eu sou mais valente:
Haja seca ou haja enchente
Eu não deixo o meu sertão.

Geraldo Amancio Pereira,
Para quem eu bato palma,
Lhe peço um pouco de calma:
Também seca é passageira.
Veja que fé verdadeira
Existe no coração
Do Wanderley nosso irmão
Dizendo agora pra gente
Que vai chover novamente
E ele volta pro sertão!...” 

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