segunda-feira, 3 de setembro de 2012


ÀS MÃOS DA MÃE MARIA


Pedro Paulo Paulino

Uma das pessoas mais queridas de Vila Campos não nasceu aqui nem tinha parentesco com a gente desta povoação. Mesmo assim, era sumamente estimada, e contada era a casa em que um menino ou menina não lhe estendesse a mão para pedir-lhe a bênção. Maria Couto Luciano, ou Mãe Maria, chegou em Campos no início dos anos 60, acompanhada do marido, o lavrador Pedro Martins, e aqui se estabeleceram e formaram família. Vindos da região de Maranguape, guardavam costumes serranos, destacaram-se na lida com a terra e transformaram uma pequena vazante num sítio onde os cajueiros, os pés de graviola, de cajá umbu, de siriguela, laranjeiras e limoeiros faziam sensível diferença cercados pela caatinga.
Mãe Maria, além de dedicada dona de casa, cevava suas galinhas e era uma exímia torradeira de café no caco. Era uma senhora de ventre saliente, como que permanentemente grávida, rosto míudo por trás de óculos de tamanho desproporcional, conservava o cabelo sempre bem atado e um sorriso angelical. Sua condição de mulher aplicada à família, sua bonomia impagável e as prendas que costumava oferecer à vizinhança, em forma de graviola, doce de caju ou um jerimum do pequeno sítio, já lhe davam cacife para ser querida de todos. Mas ela tinha um dote mais especial ainda: Maria Couto era a parteira do lugar.
Uma grande leva de contemporâneos da minha geração, em Vila Campos, foram recepcionados neste mundo pelas mãos bondosas da Mãe Maria. Assim como eu, muitos conterrâneos cresceram sob a disciplina dos pais que, dentre outros ditames, ensinava-nos a pedir a bênção àquela mulher que para nós virou uma segunda mãe e por quem tínhamos um respeito acima de tudo. Meninos, não entendíamos claramente o porquê dessa reverência. Hoje, naturalmente, podemos calcular a importância que uma pessoa como ela teve num passado ainda recente, dentro de uma comunidade que durante muito tempo precisou do trabalho voluntário e domiciliar da Mãe Maria. Por isso, a maioria das senhoras deste lugar tinham-lhe, também, uma atenção maternal. Seria mais apropriado afirmarmos que éramos netos da Mãe Maria, haja vista que as mães já a tinham como mãe.
Com a velhice, Mãe Maria foi deixando seu ofício de parteira, os costumes foram mudando e hoje não há mais a parteira do lugar. Em minha memória, continua plenamente viva a lembrança daquelas mãos magrinhas que tantas vezes me abençoaram e que me receberam no mundo naquela madrugada de três de setembro de 1967. Se sorriso fosse coisa palpável, declaro que tive muita vez desejos de segurar entre as mãos aquele sorriso amável e constante da Mãe Maria. Que Deus a tenha!

2 comentários:

  1. Ah entao tem festa na Vila hoje? Parabens ,tanta Saude e que seus Sonhos se Realizem .

    Seguidora.

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  2. Muito bela a história de Mãe Maria, que era uma doadora de vida, uma pessoa do bem, que veio ao mundo para servir de todas as formas, dar-se e ajudar a construir um mundo melhor, talvez pouco exigindo em troca. Somente o fato de cultivar graviola,laranja, cajá e siriguela na aridez do sertão, aproveitando uma pequena vazante, já é uma demonstração de fé, de criatividade, de otimismo. Ser parteira, mais nobre ainda.
    Há muito tempo acredito que a evolução da sociedade sob o ponto de vista científico, cultural ou político não quer dizer que não haja também retrocesso noutras dimensões do ser humano, como a moral e a espiritual. Numa cidade grande, com as pessoas alienadas da natureza e de muitos valores que são eternos, que valor tem uma mulher como a Mãe Maria? Nenhum, sobretudo porque era humilde, tinha poucas posses e pouca instrução. É duro constatar isto, mas é assim que o mundo está...
    Flávio Henrique

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