sexta-feira, 7 de outubro de 2011

CORDEL


O poema de gracejo “A gata que mãe criava”, de José Moura de Oliveira, retrata um tema que é objeto até mesmo de estudo da psicologia e sempre vira assunto na imprensa: a adoração a animais domésticos. Com a originalidade própria do poeta espontâneo, o autor, natural do Município da Prata, Paraíba, usa de bom-humor com muita desenvoltura nos versos que seguem:

A GATA QUE MÃE CRIAVA


José Moura de Oliveira

Mãe criava uma gatinha
Com amor e com cautela
Fazia a vontade dela
Porém, não fazia a minha
Pela amizade que tinha
Pra gata, tudo comprava
Até água, só lhe dava
Se fosse água mineral
Que outra fazia mal
À gata que mãe criava

Mãe tinha tanto ciúme
Que brigava com a gente
E a gata, facilmente
Encheu-se de mal costume:
Usava cada perfume
Que nem miss-mundo usava
No lugar onde passava
Espalhava aquele cheiro
Era mesmo um exagero
A gata que mãe criava

Não comia mais feijão
Nem arroz e nem batata
Tinha dia que essa gata
Só queria macarrão
Se fosse com requeijão
Que não sendo, recusava
Aquilo me irritava
Do corpo todo tremer
Eu já ‘tava pra não ver
A gata que mãe criava

Pra não mais me aborrecer
Me retirava pra fora
Dizendo: estou vendo a hora
Mãe ensinar ela a aler
Pra engordar e crescer
Todo conforto mãe dava
Com dois meses já estava
Neste tratamento assim
Mais gorda do que Delfim*
A gata que mãe criava

Deitar na sala, ela ia
Na poltrona ou na janela
Os horários de novela
A danada não perdia
A das seis, ela assistia
Pela das sete esperava
Na das oito, já estava
Cochilando no lugar
Sem sair nem pra mijar
A gata que mãe criava

Um dia, eu e ‘tava deitado
Já quase ao anoitecer
Começou aparecer
Uns gatos pelo telhado
Num barulho tão danado
Que a gata não se aguentava
Um minuto não deitava
Arrepiando o cabelo
Eu vi logo o desmantelo
Da gata que mãe criava

Mais tarde, foi pra janela
Começou olhar pra ima
Minha mãe, com toda estima
Até cheiro dava nela
Procurando agradar ela
Mas nada lhe agradava
Dquanto mais mãe ajeitava
Mais ela achava ruim
Era o começo do fim
Da gata que mãe criava

Mãe, nesta situação
Sem ter mais o que fazer
Perguntava: quer comer?
Ela respondia: nião
Lá no telhado, um gatão
De vem em quando miava
Ela deitada, escutava
Mas não ficava deitada
Já estava apaixonada
A gata que mãe criava

O meu irmão foi dormir
Deixando a janela aberta
A danada, muito esperta
Aproveitou pra sair
E sem ninguém pressentir
Seu conforto abandonava
Fugindo pra onde estava
A gataria medonha
Que tiraria a vergonha
Da gata que mãe criava

Quando amanheceu o dia
Que todos tinham acordado
Se notou que do telhado
A gata fugido havia
E mãe, sorrindo, dizia:
- Por isso eu já esperava
E eu também confirmava:
Ela fugiu com os gatos
Trocou requeijão por ratos
A gata que mãe criava

_______________
*Delfim Netto, ex-ministro de governos militares.


ATENÇÃO! 
Estreamos hoje uma sessão do blog: NOSSA LÍNGUA. A cada dia, um termo coloquial do linguajar nordestino e seu significado. Começamos por:


ATUBIBAR - No CE significa: 1. Perseguir, rastrear. 2. Apoquentar, encher o saco, inquizilar. (Dicionário do Nordeste - Fred Navarro)







Um comentário:

  1. Cara achei muito interessante esse cordel, morri de ri, faço questão de declamar e divulgar o nome do autor dessa obra belíssima .
    Sou poeta, porém só não escrevo cordel, mas admiro a arte de brincar com as rimas, parabéns.

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