domingo, 1 de maio de 2011


AQUELA QUINTA-FEIRA SANTA…

…Era mesmo típica, calma e envolvida pela atmosfera sacra prenunciando o dia da Paixão de Cristo. Tudo chamava a atenção para o dia seguinte. Os costumes, obedecidos à risca: abstinência de carne, principalmente. Bebida alcoólica, nem pensar. Para os consumidores contumazes, permissão apenas para uma moderada taça de vinho, e pronto. O reencontro de entes queridos no lar, tudo em ambiente de total serenidade. A própria natureza comungava tacitamente dessa harmonia: manhã tranquila, pressagiando um início de tarde daqueles mais circunspectos, infundindo em nosso espírito a prudência e o respeito.
Eu até já me sentia, nesta quinta-feira santa que passou, o menino obediente e quieto que se portava como manda o figurino neste período litúrgico. Nada de excessos naquele dia, que, além do seu caráter sagrado, cobrou-nos a nossa atenção cívica, por ter sido também o dia de Tiradentes. A paz e o sossego deste recanto onde moro contribuíam para dar àquela quinta-feira o tom correto de Dia Grande, como aqui se costuma dizer.
Mas eis que de repente, o clima monástico foi quebrado e todo o protocolo também. A aura santificada evaporou-se num átimo, como se um tornado – redemunho mesmo, aqui pra nós – tivesse alterado a ordem de cada coisa. Ocorre que, avistei aproximando-se do pátio da minha casa, um comboio de quatro carros, isto mesmo, que chegou trazendo muita gente e muita alegria. De uma hora para outra, pensei que estivesse vendo alguma miragem. Mas a ilusão de uma ilusão óptica foi logo desfeita, quando a caravana esbarrou e seus componentes começaram a desembarcar, um a um. Eram eles, meus amigos Marreiro, que chegavam. A princípio, deduzi que fossem cerca de oito pessoas, depois contei minuciosamente dez.
Capitaneando a tropa, estavam Demétrius e Lia, que pela terceira ocasião dão-me o prazer de suas visitas. Fiz minha vez de anfitrião surpreendido mas não menos à vontade, principalmente, quando atentei para as ofertas que os visitantes me traziam de modo explícito. Demétrius e Lia de longe ostentaram uma garrafa da aguardente mineira Ferreira Januário (até então desconhecida para mim), que eles trouxeram de seu recente passeio pelas Alterosas. Minha surpesa cresceu com o maço de cigarros de palha que eles também me presentearam, original da terra de Tiradentes, coincidência ou não no seu dia. Isto, só para começar.
Improvisamos nossa tenda debaixo do sombreado de um pé de cajá-umbu que tem no meu quintal. A segunda providência foi arquitetar uma churrasqueira (que peixe coisa nenhuma!). Narcélio provou sua habilidade nesse ponto. E a descontração correu à solta. Um violão decorativo ilustrava o cenário, de vez que ninguém ali, para nosso bem ou mal, dedilhava o pinho, embora alguém ainda tenha mostrado alguma prática nessa arte. Todos já vinham muito animados, pois, durante o trajeto Canindé-Vila Campos, fizeram uma escala providencial no estabelecimento de um certo Zé Baderna, que, pelo que sei, a despeito do nome do dono, é um ambiente pacífico.
Um breviário de boa prosa e poesia foi então aberto. Os brindes amiudaram. Cada um de todos contou uma história divertida, ou uma observação curiosa, ou uma piada inteligente, ou uma rima, ou ensaiou alguma cantiga. Não faltou, claro, a narrativa dos causos admiráveis e jocosos de Canindé e até mesmo aqui da Vila. Severino, lúcido sempre, pedia vez em quando um aparte para contar alguma coisa espirituosa. A tarde também foi ficando inebriada, a ponto de chover à beça, fazendo correr todo mundo para o alpendre da casa.
E antes que o programa encerrasse, foi conveniente uma esticada até à vila de Campos Velho, onde fica a capela de S. Roque. Não que fôssemos para lá, pois a caravana rumou decretado para o barzinho do lugarejo. Ali, até um torneio de sinuca aconteceu. É oportuno frisar que toda essa gente veio aqui na mais perfeita ordem (alfabética): Demétrius, Francisco, Lia, Lucas, Marreiro Neto, Mayara, Narcélio, Severino, Socorro e Widja. E, para provar que não estou faltando com a verdade, o jovem casal Lucas e Widja registraram a ocasião com uma excelente câmera digital e muita sensibilidade.
Assim como aconteceu, confio que todo sacrilégio será perdoado…

Para ver as fotos, clique no link abaixo:
http://www.flickr.com/photos/widjaq/sets/72157626566117288/



Um comentário:

  1. Nosso anfitrião, como sempre, foi bastante acolhedor e faz pagar qualquer viagem e esforço com sua cultura, sua personalidade e ainda justifica nosso aplauso.


    Abrigado, Grande Poeta.



    Demetrius

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