Pedro Paulo Paulino
A cidade amanhece e anoitece vazia. Os dias, de domingo a
domingo, assumiram rosto de grande feriado como a Sexta-feira Santa. A paz e o
silêncio, de mãos dadas (esses podem dar-se as mãos!) passeiam nas vielas, ruas
e avenidas; sentam na praça, embora nada conversem, pois o silêncio e a paz
entendem-se telepaticamente. O vento, a luz, as borboletas também se locomovem
livres nos labirintos desses vários mundos a que chamamos cidades e que são
ordinariamente território estrondoso da agitação, do vozerio e dos decibéis
invasivos da parafernália humana.
Nesses dias incomuns e longos, quem por força das
circunstâncias não deve transitar em plena liberdade são os verdadeiros donos
desses habitats: os humanos, tolhidos repentinamente em seu vaivém eterno em
busca do tudo e do nada num só tempo. Um inimigo que de tão pequeno é invisível
nos manietou. E nos enjaulou em nossos tugúrios de pedra e nos fez reféns da
espada diabólica de uma peste mundial, eufemisticamente chamada de pandemia.
A humanidade, em seu tumulto incessante, em sua atividade
formidável, não contava decerto com a astúcia de um serzinho a princípio
insignificante e sua invasão insidiosa nos domínios do fenômeno humano.
De repente, um verme inconcebivelmente mau agarra o mundo e o
bota de ponta-cabeça. Um profeta apocalíptico que estaciona o sol do trabalho,
do progresso e da dinâmica da vida dos homens. Um intruso que altera comportamentos,
regras, etiquetas e dita novas ordens contrárias mesmo ao bom senso. Ser
solidário agora, por incrível que possa, é não estender a mão, é se afastar um
do outro e se enclausurar dia e noite. Ser bonzinho agora é ficar distante do
próximo, por contraditória que seja esta afirmação.
Em meio ao dilúvio pandêmico, convertemos nossos lares em
arcas salvadoras, e dentro delas não sabemos ainda quando pisaremos terra firme,
se em quarenta dias ou menos ou mais. Insulados, estamos testando nosso estoicismo,
nossos princípios e crenças hipoteticamente inabaláveis.
No epicentro do pandemônio, adaptação tornou-se a palavra de
ordem. E assim, usos e costumes e coisas vêm-se amoldando a esses dias tão incertos.
Nos estádios esportivos transformados em emergência, entra em campo o time
operoso a serviço da saúde pública, numa partida nervosa contra o adversário
sinistro. Nas arquibancadas, somente o tempo e a esperança assistem de camarote
ao duelo dos exércitos da salvação contra o gladiador virulento, numa batalha singular.
Meu amigo Pedro Paulo, uma ótima crônica de nossos dias de isolamento. Eu mesmo, devido à uma simples gripe, fui afastado do trabalho por 14 dias e retorno amanhã, sábado de Aleluia. Confesso que aguardo ansioso por dias melhores. O confinamento em casa, mesmo com todo o conforto de ter o salário garantido no fim do mês sem a necessidade de labutar no almoço pra comprar o jantar, como milhares de trabalhadores informais, não é das melhores experiências. A incerteza da realidade do que está ocorrendo no mundo, as notícias falsas e alarmantes, a verdade oculta, as teorias de conspiração, etc... E o pior de tudo: no trabalho nós escapamos de nosso mundinho cheio de problemas domésticos, assim como no aconchego do lar temos uma válvula de escape do estresse profissional, uma balança que equilibra nossas emoções. Um forte abraço.
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