“OS
HOMENS QUEREM PAZ”: 25 ANOS
Uma
história que não sai da memória dos habitantes de Vila Campos
No
dia 28 de março de 1991, uma equipe de produção da tevê Globo despedia-se de
Vila Campos, no interior de Canindé, depois de duas semanas de locações que
tiveram o povoado como cenário. As filmagens do especial “Os homens querem paz”
agitaram o cotidiano da pacata vila que foi transformada na Soledade dos anos
30 – palco de ataques do bando de Lampião. É para lá que regressa Emerenciano,
remanescente do bando, na intenção de fazer vingança dez anos depois de ter
sido humilhado, espancado e preso pelos habitantes de Soledade.
Nada,
antes nem depois, aconteceu na localidade, que se tornasse tão marcante na
memória do seu povo quanto a chegada da equipe televisiva, com seus caminhões
cheios de apetrechos: câmeras, monitores, geradores, refletores, grua, trilhos
etc. Dois ônibus leito transportavam técnicos, cenógrafos e o elenco que
incluía Herson Capri, Roberto Bonfim, Cláudio Mamberti, Flávio Migliaccio,
Regina Dourado, Haroldo Serra, Roberto Frota, Paulo Betti e a estreante Letícia
Sabatella.
Além
dos equipamentos que trazia, em Vila Campos a produção adquiriu 50 cavalos e
cavaleiros, 50 cães e até uma coruja. Para que a povoação se transformasse na fictícia
Soledade, foram removidos os postes de eletrificação, paredes foram
envelhecidas e outros sinais de modernidade foram camuflados. Não demorou, também,
para que seus habitantes tomassem parte nas gravações. E assim, muitos deles
tiveram que abandonar temporariamente a roça – já que era inverno e o sertão
estava banhado de chuvas – para participar das cenas. Desde já, figurantes trajavam
triunfalmente seus uniformes de soldados da volante do sargento Romão (Roberto Bonfim) ou roupas de cangaceiro e ouviam as vozes
de comando de Luiz Fernando Carvalho, diretor do filme.
No
desenrolar das tomadas, o bucolismo característico do lugar desaparece. O pátio
amplo da vila, até então movimentado uma vez por ano nos festejos do padroeiro,
é sacudido extraordinariamente pelo tropel de cavalos, tanto dos cangaceiros quanto
dos soldados, numa atmosfera típica de guerra.
A
casa de Antônio Paulino passa a ser a casa do promotor dr. Olympio (Herson
Capri). Ao lado da capela, a casa da professora Susana Viana vira o orfanato
dirigido pelo padre Rolim (Claudio Mamberti). O casarão de seu Pedro Silva,
patriarca do lugar, torna-se então a residência de Joca de Amália (Roberto
Frota). O boteco da vila serve como a oficina do ferreiro (Haroldo Serra). O
grupo escolar é agora a delegacia. E a prosaica bodega de seu Júlio Gomes transforma-se
no armazém São Roque.
Sobre
a calçada extensa da velha bodega, um número vistoso de espectadores, vindos de
vários lugares, assiste aos trabalhos de filmagem e observa ali, ao vivo, a
meticulosa e árdua tarefa cinematográfica. Muitas cenas são gravadas e
regravadas, até atingir a qualidade final. Os bastidores mostram os truques e a
magia da sétima arte.
Pesquisando
entre os campesinos uma fisionomia parecida com a de Lampião, o olhar clínico
da produção viu no rosto do Chico Manoel, um sertanejo pacífico, traços
semelhantes aos do rosto do famigerado bandoleiro. Não deu outra. Em instantes,
estava o Chico Manoel encarnando o Rei do Cangaço. A pequena Daniela Paulino
fez o papel de Ritinha na infância, personagem da atriz Letícia Sabatella.
O
dia da grande luta aproxima-se. Diariamente, ouvem-se os estampidos dos tiros dos
rifles dos cangaceiros e dos revólveres dos soldados, que cruzam montados em
seus cavalos e em grande velocidade o pátio da vila, coberto de poeira gerada
por uma máquina. Os figurantes correm para lá e para cá. A chegada de
Emerenciano, vivido por Paulo Betti, deixa a cidade em polvorosa. O padre, o
promotor, o delegado e demais autoridades articulam um meio para expulsar o
cangaceiro. E por aí vai se desenrolado a trama.
Soledade
vive momentos de apreensão e ameaças de terror. E Vila Campos vive seu momento
de glória e de fama, com seu nome estampado em páginas de jornais. Mas tudo
acaba numa boa, pois, na realidade, o clima era de perfeito entrosamento entre produção,
atores, figurantes e moradores. Soldados e cangaceiros, nos intervalos,
discutiam com festa a atuação deles.
Naquele
último dia das gravações, que era uma quinta-feira santa, a chuva constante
contribuiu para fermentar a saudade que ficaria nos que testemunharam essa temporada
diferente, cheia de novidades e de animação para a rotina monótona do lugar. Até
parece que as cenas ficariam gravadas mais na memória dos nativos do que na
película que foi ao ar no dia dois de abril daquele ano. É como se tivesse sido
ontem. De forma que hoje, quando se comenta esse acontecimento em Vila Campos,
não há quem não se interrogue, com espanto: já faz 25 anos?!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirRapaz eu tinha 13 anos, lembro como se fosse hoje ! Como minha mãe é de São Luis e estávamos lá aproveitando o feriado da semana santa, fomos assistir as gravações. Lembro da simpatia de Roberto Bonfim, Paulo Betti que reclamava bastante do calor, as brincadeiras de Flavio Migliaccio, realmente foi muito marcante. O que mais me intriga até hoje, é como a produção global foi descobri aquele lugar que parece esquecido por Deus, intocado ali em pleno sertão, como é que chegaram ali ? Enfim, busquei e consegui o especial no youtube, vez por outra assisto novamente pra matar a saudade. Abraços a todos da Vila Campos e São Luis, onde passei muitas ferias escolares.
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