segunda-feira, 5 de março de 2012


ANIVERSÁRIO DE PATATIVA DO ASSARÉ


Hoje é o aniversário do poeta Patativa do Assaré, que completaria 110 anos. Seu nome ganhou larga projeção em todo o território nacional e até no exterior. Poeta de bancada e também cantador de viola, Patativa é um dos mais conhecidos seguidores da escola de Catulo da Paixão Cearense e de Juvenal Galeno. Embora a mídia tenha explorado o lado humilde do cidadão Antonio Gonçalves da Silva – seu nome de batismo – retratando-o como um poeta sofrido e combativo com a causa do homem do campo, o que é fato, Patativa foi claramente um homem de leitura eclética. Muitos de seus versos têm uma certa cadência de Castro Alves, de Rogaciano Leite e até de clássicos, como Camões, para quem fez uma ode. Como sonetista, Patativa confirma mais uma vez seu contato com os eruditos.
Seu primeiro livro, Inspiração Nordestina, de 1956, é seu trabalho mais puro e genuíno. Após este livro, escreveu outros que também tiveram repercussão, tendo já como cerne uma temática mais abrangente, inclusive, focalizando aspectos da vida urbana. Ganhou vários prêmios e títulos por suas obras. Atraído por políticos, é possível que tenha se contradito em seu ponto de vista crítico, mas o carinho e o respeito do público por ele não foram abalados. Sua grande popularidade tornou-o também alvo fácil dos pesquisadores e acadêmicos. Há um sem-número de publicações, teses, monografias, ensaios e artigos na imprensa sobre o vate cuja fama deu um grande salto através de Luiz Gonzaga, que da autoria de Patativa gravou A Triste Partida e Boi Fubá, esta última sucesso também nas vozes de Fagner e de Rolando Boldrin.


TRAÇO BIOGRÁFICO

Antonio Gonçalves da Silva, dito Patativa do Assaré, poeta, agricultor, nasceu a 5 de março de 1909 no pequeno sítio chamado de Serra de Santana, distante três léguas do município de Assaré, no Sul do Ceará, e faleceu com 93 anos em 8 de julho de 2002 no mesmo município.
Em Autobiografia refere que (...) “quando completei oito anos fiquei órfão de pai e tive que trabalhar muito (...) com a idade de doze anos, frequentei uma escola muito atrasada, na qual passei quatro meses (...) daquele tempo pra cá não frequentei mais escola nenhuma, porém, sempre lidando com as letras quando dispunha de tempo para este fim. (...) De treze a quatorze anos comecei a fazer versinhos que serviam de graça para os serranos, pois o sentido de tais versos era o seguinte: Brincadeiras da noite de São João, testamento do Judas, ataque aos preguiçosos que deixavam o mato estragar os plantios das roças etc. Com 16 anos de idade, comprei uma viola e comecei a cantar de improviso (...) Perdi a vista direita, no período da dentição, em consequência da moléstia (...) conhecida por dor-d’olhos.”

INGÉM DE FERRO

Patativa do Assaré

Ingém de ferro, você
Com seu amigo motô,
Sabe bem desenvorvê,
É munto trabaiadô.
Arguém já me disse até
E afirmô que você é
Progressista em alto grau;
Tem força e tem energia,
Mas não tem a poesia
Que tem o ingém de pau.

O ingém de pau quando canta,
Tudo lhe presta atenção,
Parece que as coisa santa
Chega em nosso coração.
Mas você, ingém de ferro,
Com este horroroso berro,
É como quem qué brigá,
Com a sua grande afronta
Você tá tomando conta
Dos nossos canaviá.

Do bom tempo que se foi
Faz mangofa, zomba, escarra.
Foi quem expulsou os boi
Que puxava na manjarra.
Todo soberbo e sisudo,
Qué governá e mandá tudo,
É só quem qué sê ingém.
Você pode tê grandeza
E pode fazê riqueza,
Mas eu não lhe quero bem.

Mode esta suberba sua
Ninguém vê mais nas muage,
Nas bela noite de lua,
Aquela camaradage
De todos trabaiadô.
Um falando em seu amô
Outro dizendo uma rima,
Na mais doce brincadêra,
Deitado na bagacêra,
Tudo de papo pra cima.

Esse tempo que passô
Tão bom e tão divertido,
Foi você quem acabô,
Esguerado, esgalamido!
Come,come interessêro!
Lá dos confim do estrangêro,
Com seu baruio indecente,
Você vem todo prevesso,
Com históra de progresso,
Mode dá desgosto a gente!

Ingém de ferro, eu não quero
Abatê sua grandeza,
Mas eu não lhe considero
Como coisa de beleza,
Eu nunca lhe achei bonito,
Sempre lhe achei esquesito,
Orguioso e munto mau.
Até mesmo a rapadura
Não tem aquela doçura
Do tempo do ingém de pau.

Ingém de pau! Coitadinho!
Ficou no triste abandono
E você, você sozinho
Hoje é quem tá sendo dono
Das cana do meu país.
Derne o momento infeliz
Que o ingém de pau levou fim,
Eu sinto sem piedade
Três moenda de sodade
Ringindo dentro de mim.

Nunca mais tive prazê
Com muage neste mundo
E o causadô de eu vivê
Como um pobre vagabundo,
Pezaroso, triste e pérro,
Foi você, ingém de ferro,
Seu safado, seu ladrão!
Você me dexô à toa,
Robou as coisinhas boa
Que eu tinha em meu coração!

Nenhum comentário:

Postar um comentário