domingo, 17 de julho de 2011

ALMANAQUE DE DOMINGO

UM FATO

Serrote Logradouro: no mapa da mina
Este cenário poderá deixar de ser o mesmo num futuro próximo. No pé do serrote Logradouro, nos arredores de Vila Campos, instalou-se há poucos dias uma mineradora. Não temos dados precisos sobre a empresa, mas já é possível ver caminhões transportando imensos blocos de pedra que estão sendo extraídos no local. Vila Campos é cercada por uma cordilheira de montanhas baixas e o Serrote Logradouro afigura-se como o guardião dessa ciranda de serras. Segundo os mais antigos, no início da década de 40, esses serrotes tornaram-se o eldorado para os sertanejos durante uma seca prolongada. Foi detectada no local uma mina de rutílio e a exploração desse mineral foi uma verdadeira fonte de economia para os camponeses durante o flagelo da estiagem. Agora, a exploração de outro tipo de minério acontece em grande escala. Voltaremos a detalhar o assunto em breve aqui no blog.

UMA ANEDOTA

Do livro “A Praça do Ferreira – República do Ceará Moleque”, de Juarez Leitão, recolhemos esta:

“Conta Daniel Carneiro Job que, uma tarde, Demócrito Rocha passou cedo pelo Majestic e encomendou ao seu João quatro avoantes para tira-gosto da cerveja que tomaria mais tarde, no fim do expediente do jornal. O atarefado garçom se esqueceu completamente da encomenda e quando viu, por volta das 18 horas, chegar o freguês acompanhado de um amigo, procurou uma saída. Raspou lá pelas panelas uns restos de avoantes, enfeitou com tomates e alfaces e trouxe o pedido para a mesa com a cerveja geladíssima. Demócrito examinou o prato e viu logo a enrolada: ali só tinha pernas e asas. Reclamou:
- Seu João, cadê a titela da bicha?
E o esperto João Marques, fingindo estupefação:
- Foi bem a arma do caçador que levou. Eita, tiro lascado!!!

UM SONETO

Um dos sonetos mais conhecidos em todo o mundo literário é o “Soneto d’Arvers”, do poeta e dramaturgo francês Aléxis-Félix Arvers. Seu célebre soneto inspirou diversas traduções, peças e livros dedicados inteiramente ao seu desvendamento motivando extrema curiosidade sobre a musa que o teria inspirado. No Brasil, foi traduzido entre outros por J. G. de Araújo Jorge e por Guilherme de Almeida. Reproduzimos aqui a tradução feita pelo poeta e educador cearense Filgueiras Lima (1909-1965):

“Tenho na alma um segredo e na vida um mistério,
Um grande e eterno amor num momento nascido
Sem esperança, oculto, é um mal sem refrigério
Daquela que o inspirou nunca jamais sabido.

Ai de mim! Ao seu lado irei despercebido,
Junto dela, e sozinho, embevecido e etéreo
E chegarei ao fim de meu viver funéreo
Sem nada haver ousado e nada recebido.

E ela, a quem o Senhor fez de ternura cheia,
Irá em seu caminho inteiramente alheia
Ao murmúrio de amor que aos seus pés cantará.

E, fiel ao dever que austeramente zela,
Dirá, talvez, ao ler meus versos cheios dela:
‘Que mulher será esta?’ – e não compreenderá.”

UM REPENTE

Cantavam Inácio Bezerra de Sousa, de São João do Cariri (PB) e José Bernardino de Oliveira, de São José do Egito (PE), quando Inácio termina um improviso filosofando:

“Este mundo é puro engano;
A vida não vale nada!”

Fazendo retrospecto de sua vida, Bernardino completa o esboço da sentença:

“Eu já fui quase uma fada,
Tesoureiro da moeda!
A sorte me fez subir,
Para depois dar-me queda!...
A vida é como garapa,
Que por qualquer coisa azeda!”

(“Antologia Ilustrada dos Cantadores”, de Francisco Linhares e Otacílio Batista)

UMA CURIOSIDADE

Neste período do ano em que o Leão do Imposto de Renda passa a devorar com selvageria o bolso do contribuinte, relembremos Lady Godiva, “nobre anglo-sacônica (c.1040-1080), famosa pelo seu legendário passeio a cavalo por Coventry, Inglaterra. Seu marido, Leofric, conde de Mércia, prometera reduzir os impostos que recaíam sobre o povo da região, se Lady Godiva passeasse nua pelas ruas da cidade, montada num cavalo branco. Segundo a lenda, todos os homens ficaram em casa enquanto ela cumpria a promessa; apenas um (‘peeping Tom’) tentou ver o espetáculo. Hoje em dia, os impostos continuam mais selvagens do que nunca. Mas certamente não é por isso que se veem tantas godivas mostrando sua exuberância carnal. E todos somos “peeping Tom”.

UM PENSAMENTO

“Creio no riso e nas lágrimas como antídotos contra o ódio e o terror.” (Charles Chaplin)

UM CAUSO

Altay Pereira, por e-mail, nos manda esse causo do Bunaco que, por sua vez, já lhe foi repassado pelo radialista Tonico Marreiro.

“Findava o ano de 67. Um ano de seca. O açude São Mateus esturricou. A cidade de Canindé era abastecida através de uma adutora, que fornecia a água que restava nos porões do açude Salão. O ano seguinte se iniciava sem sinais de chuva. Num domingo de carnaval, Walter Cruz, de saudosa memória, e Dona Mundinha reuniram os amigos na Fazenda São Pedro. Chico Walter ao violão cantava para o agrado de todos. De repente, ele pára e entra no assunto que era discutido no momento: a falta d’agua em Canindé. 
Opinião de um e de outro, quando o poeta Celso Góis se vira para o Bonaco e diz:
- Bonaco, essa água do açude Salão não serve pra nada. O Bonaco pergunta por quê. Celso Góis explica:
- Bunaco, a água tá verde, verde...
A resposta do Bonaco foi em cima da bucha:
- Serve sim, Celso. Serve para lavar pano de sinuca...”

UMA HOMENAGEM

Antonio Alves Pereira, o Antonio da Carroça, é uma das personagens mais populares do meio urbano canindeense. Sua carrocinha de bijuterias é a mais conhecida e mais enfeitada de tantas que trafegam pelas ruas da cidade. Melhor dizendo, é a pioneira, pois foi ele o primeiro a ter a ideia de botar sobre duas pequenas rodas de bicicleta, o seu comércio ambulante. Onde quer que se ache um caminhão de romeiros em Canindé, o Antonio da Carroça se diz presente. Sexagenário aposentado, nem por isto abandou sua atividade de camelô, tradição que herdou de seu pai, que por sua vez foi o maior vendedor de folhetos de cordel da cidade. Costumava ir a Juazeiro do Norte para de lá trazer pacotes de folhetos adquiridos nas velhas tipografias, como a Lira Nordestina. Na minha meninice, fui seu cliente fiel. O filho deu sequência honrada à tradição do pai.
Cadê a CDL de Canindé que não homenageia o Antonio da Carroça?!

UMA IMAGEM

UM ÓTIMO DOMINGO

3 comentários:

  1. Bom-dia, poeta laureado, sobre o soneto de Arvers, entretanto, a contribuição mais original para a língua portuguesa foi a do poeta simbolista Cruz e Souza, que, numa tradução criativa, apresenta a versão de seu próprio drama pessoal...


    ETERNO SONHO


    Talvez alguém estes meus versos lendo

    Não entenda que amor neles palpita,

    Nem que saudade trágica, infinita

    Por dentro dele sempre está vivendo.


    Talvez que ela não fique percebendo

    A paixão que me enleva e que me agita,

    Como de uma alma dolorosa, aflita

    Que um sentimento vai desfalecendo.


    E talvez que ela ao ler-me, com piedade,

    Diga, a sorrir, num pouco de amizade,

    Boa, gentil e carinhosa e franca:


    -- Ah! bem conheço o teu afeto triste...

    E se em minha alma o mesmo não existe,

    É que tens essa cor e é que eu sou branca!

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  2. Desde que PEDRO PAULO criou este blog, foi esta a MELHOR POSTAGEM que ele já fez. Está inspiradissimo, com certeza. A homenagem ao TÕE DA CARROÇA me comoveu. Foi das mãos dele que eu comprei Cancão de Fogo, Zé Pretinho, Pedro Malazartes e tantos outros folhetos importantes na minha formação como artista popular. Merece um troféu, mas não é de CDL nem de locutores picaretas... Ele merece, sim o TROFÉU CHICO BUNACO.

    Leitor, é chegado o tempo
    De cultivar a verdade
    De combater a mentira
    O engodo e a falsidade
    Para não causar espanto
    Vamos começar, portanto
    Aqui por nossa cidade

    Canindé há muito tempo
    Vive rendendo homenagem
    A certos vultos, os quais
    Têm somente pabulagem
    Deixam de lado pessoas
    Humildes, mas muito boas
    Nas quais eu vejo vantagem

    Se é para dar um troféu
    Aos vultos de Canindé
    Eu vou dizer nesta lista
    Cada um deles quem é
    Suas obras, seus valores
    Verdadeiros benfeitores
    Nesta Cidade da Fé.

    Viva o Tõe da Carroça, maior merecedor do TROFÉU CHICO BUNACO, a maior comenda já instituida na cidade do "imitador de Jesus".

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  3. O pior preconceito que existe é do Nordestino contra os seus conterrâneos, do homosexual contra seus semelhantes e do negro contra os de sua própria cor. Cruz e Sousa foi muito infeliz nesse soneto, julgando-se inferior à musa branca. O talento dele e sua própria condição de poeta o colocam acima de qualquer coisa.

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