Leia a seguir a
peleja em versos que tive com o poeta Aderaldo Luciano, um cearense da região do
Crato morando atualmente no Rio de Janeiro. Provoquei o poeta, quando o vi de
volta ao convívio dos amigos no Facebook, depois de um período em que ele
esteve ausente dessa rede social na internet. Aderaldo respondeu à minha
provocação e a coisa transformou-se numa autêntica cantoria na noite de
29 de outubro. A lua plena no céu sem nuvens nos convidava a rimar – eu aqui na
Vila Campos, em pleno Sertão Central do Ceará, e Aderaldo Luciano na capital
fluminense. Trocando a viola pelo teclado do computador, parecia que estávamos
frente a frente no terreiro, engalfinhados nesta cantoria em tempo real através
do milagre fantástico da comunicação eletrônica.
A. Luciano e PPP |
PELEJA DOS POETAS:
PEDRO PAULO PAULINO
E ADERALDO LUCIANO
Aderaldo Luciano,
Poeta de inspiração,
Desapareceu do “Face”,
Sem dar mais explicação.
Mas agora está de volta,
Sem precisar de escolta,
Para alegrar o sertão.
Foi Pedro Paulo Paulino,
Poeta de pé-rachado,
Quem liderou a revolta
Da planta contra o machado.
Passados, do tempo, os lastros
Ainda veremos rastros
Do seu trabalho pesado.
PP - Nessa luta fabulosa,
Rachei do meu pé a planta,
Defendendo a natureza,
Condenando quem não planta.
Posso afirmar, consciente:
Nem a Dilma, presidente,
Meu projeto não suplanta.
AL - Meus dedos detêm as farpas,
Furei as mãos nos espinhos.
Das taliscas de madeira
Recebi rudes carinhos.
Cipoadas de aroeiras,
Armadilhas traiçoeiras
Adornavam meus caminhos.
PP - Os cactos do meu terreiro,
Com a seca tão horrenda,
Se tornaram bons amigos
(Que o espinho não me ofenda!).
O verde daqui migrou,
Só mandacaru ficou
Alegrando esta vivenda.
AL - A paisagem benfazeja
De ti jamais terá pena:
Quando a noite vai caindo
É hora de paz amena.
Enquanto isso o que vejo
É carro com seu sobejo,
Fiação, poste e antena.
PP - Corra pra sua janela,
Veja a lua como está:
Mais parece uma criança
Jogada num caçuá,
Ou por outra uma pepita
Que surgiu grande e bonita
No céu do meu Ceará.
AL - Estou vendo a lua grávida
De luz em alta voltagem.
A saudade do sertão:
Companheira de viagem.
Vou me deitar no sereno
Feito um menino pequeno
Só pra contar pabulagem!
PP - A Lua é grande presença
Quando a noite se avizinha.
Todo astro em sua volta
Olha quando ela caminha
No céu, bonita e fagueira...
É ela a melhor parceira
Nesta soledade minha.
AL - Queria que a lua fosse
A lápide no meu jazigo.
Pois é o mármore mais branco
Entre os brancos que persigo.
Só confesso esta vontade
Pois na minha soledade
A lua dorme comigo.
PP - Eu estava observando
Júpiter, bem sorrateiro,
Seguindo os passos da Lua
De modo muito ligeiro,
Com pressa pra acompanhar
A Lua, em algum lugar
Desse céu alcoviteiro.
AL - Da Lua, quero o clarão.
De Júpiter, quero o tamanho.
Das águas de Iracema,
Quero o afago de um banho.
Do céu espero um corisco
Que com fogo faça um risco
Escrevendo um texto estranho.
PP - Poeta, agora responda
Qual a sua sensação
Vivendo assim tão distante
Do seu querido rincão?
Quem mora aí na cidade
Como é que mata a saudade
Do nosso velho sertão?
AL - Se eu matar a saudade
Com ela também me mato.
A distância do torrão
É o almoço mais ingrato.
Eu tenho ali uma rede
É nela que mato a sede
Do Juazeiro e do Crato.
PP - Embalando nessa rede,
Você só deve escutar
Luiz, Jackson, Ary Lobo,
Que não param de cantar...
Todos já foram embora,
Mas aqui a todo hora
Cantam, cantam sem parar.
AL - Poeta tens a vidência,
Sabes bem de nossas dores.
Pois quem vive desterrado
Prova de tristes sabores
E só dribla as tristes sinas
Com as canções nordestinas
Na voz de nossos cantores.
PP - Desta forma eu imagino
Como a saudade é gigante
De quem curte uma saudade
Do chão que ficou distante.
O seu coração se esmaga
Quando escuta de Gonzaga
“A vida do viajante”...
AL - Gonzaga em primeiro plano
Desenhando as melodias
Enquanto as aves celestes
Trazem velhas cantorias
De poetas encantados
Cortando com seus arados
A dor de todos os dias.
PP - Ouvir Gonzaga, distante,
Talvez seja mais gostoso,
Pois a saudade é tempero
Dum coração amoroso.
O mesmo é ler no papel
Em folheto de cordel
O “Pavão misterioso”.
AL - O Pavão é outro esteio
Na vida do retirante.
O seu voo é projetado
No coração do amante.
Passam dias, anos, eras,
Lobisomens, bestas-feras
E ele a voar, brilhante!
PP - Eu te comparo ao pavão,
Porém, sem nenhum mistério,
Que fugiu de sua terra
E foi para outro hemisfério,
Mas que compõe, canta e rima
E além de tudo estima
O poeta, quando sério.
AL - O engenheiro Edmundo,
quem construiu o pavão,
Trazia trancafiado
O signo de Salomão.
Desde o tempo de menino
Que Pedro Paulo Paulino
Tomou com ele a lição.
PP - É um mestre consagrado
Que devemos respeitar,
Construiu o seu pavão
Misterioso no ar...
De modo que hoje em dia
Sem a sua poesia
Não tem quem saiba voar.
AL - A poesia é um porto
Onde abrigo meu navio.
Nas docas guardo meus fardos,
No cais eu me distancio,
Busco outros mares sonhando,
Vejo o pavão flutuando
Por cima do mar bravio.
PP - Eu, que vivo no estio,
Sonhando com chuva à beça,
Ouvindo você falar
De uma coisa linda dessa,
Sinto uma certa opressão
Bem dentro do coração...
Pra chover, faço promessa.
AL - Quando a chuva prometida
É escassa ou demorada
Deixa uma ferida aberta
Cavada por uma enxada.
A terra sangra sem sangue,
Seu coração vira um mangue
De tanto furo de espada.
PP - Poeta, por gentileza,
Conte em sua tabuada
Quantas estrofes fizemos
Nesta noite enluarada.
28 é bom demais,
Mas se precisar de mais,
Vamos varar madrugada.
AL - São trinta e uma as estrofes
Para fazer o cordel
Sendo quatro em cada página
Quando dobrado o papel.
Três estrofes na primeira,
Capa, grampo, empilhadeira,
Vendido sempre a granel.
PP - Grande poeta, obrigado
Por essas estrofes suas.
Voltaremos a rimar
Outras noites, outras luas...
Pra você, um forte abraço.
Com esta estrofe que faço,
Somam logo trinta e duas.
AL - Agora vamos reler
E fazer adequações:
Se tem algum pé quebrado
Ou quaisquer alterações.
Foi boa a noite rimada
Vendo a lua prateada
Iluminando os sertões.
PP - Releitura é necessária,
Vamos reler, sim senhor.
O meu verso, junto ao seu,
Encontra maior valor.
Eu vou passar pro papel
Estes versos de cordel
Para entregar ao leitor.
Poeta de inspiração,
Desapareceu do “Face”,
Sem dar mais explicação.
Mas agora está de volta,
Sem precisar de escolta,
Para alegrar o sertão.
Foi Pedro Paulo Paulino,
Poeta de pé-rachado,
Quem liderou a revolta
Da planta contra o machado.
Passados, do tempo, os lastros
Ainda veremos rastros
Do seu trabalho pesado.
PP - Nessa luta fabulosa,
Rachei do meu pé a planta,
Defendendo a natureza,
Condenando quem não planta.
Posso afirmar, consciente:
Nem a Dilma, presidente,
Meu projeto não suplanta.
AL - Meus dedos detêm as farpas,
Furei as mãos nos espinhos.
Das taliscas de madeira
Recebi rudes carinhos.
Cipoadas de aroeiras,
Armadilhas traiçoeiras
Adornavam meus caminhos.
PP - Os cactos do meu terreiro,
Com a seca tão horrenda,
Se tornaram bons amigos
(Que o espinho não me ofenda!).
O verde daqui migrou,
Só mandacaru ficou
Alegrando esta vivenda.
AL - A paisagem benfazeja
De ti jamais terá pena:
Quando a noite vai caindo
É hora de paz amena.
Enquanto isso o que vejo
É carro com seu sobejo,
Fiação, poste e antena.
PP - Corra pra sua janela,
Veja a lua como está:
Mais parece uma criança
Jogada num caçuá,
Ou por outra uma pepita
Que surgiu grande e bonita
No céu do meu Ceará.
AL - Estou vendo a lua grávida
De luz em alta voltagem.
A saudade do sertão:
Companheira de viagem.
Vou me deitar no sereno
Feito um menino pequeno
Só pra contar pabulagem!
PP - A Lua é grande presença
Quando a noite se avizinha.
Todo astro em sua volta
Olha quando ela caminha
No céu, bonita e fagueira...
É ela a melhor parceira
Nesta soledade minha.
AL - Queria que a lua fosse
A lápide no meu jazigo.
Pois é o mármore mais branco
Entre os brancos que persigo.
Só confesso esta vontade
Pois na minha soledade
A lua dorme comigo.
PP - Eu estava observando
Júpiter, bem sorrateiro,
Seguindo os passos da Lua
De modo muito ligeiro,
Com pressa pra acompanhar
A Lua, em algum lugar
Desse céu alcoviteiro.
AL - Da Lua, quero o clarão.
De Júpiter, quero o tamanho.
Das águas de Iracema,
Quero o afago de um banho.
Do céu espero um corisco
Que com fogo faça um risco
Escrevendo um texto estranho.
PP - Poeta, agora responda
Qual a sua sensação
Vivendo assim tão distante
Do seu querido rincão?
Quem mora aí na cidade
Como é que mata a saudade
Do nosso velho sertão?
AL - Se eu matar a saudade
Com ela também me mato.
A distância do torrão
É o almoço mais ingrato.
Eu tenho ali uma rede
É nela que mato a sede
Do Juazeiro e do Crato.
PP - Embalando nessa rede,
Você só deve escutar
Luiz, Jackson, Ary Lobo,
Que não param de cantar...
Todos já foram embora,
Mas aqui a todo hora
Cantam, cantam sem parar.
AL - Poeta tens a vidência,
Sabes bem de nossas dores.
Pois quem vive desterrado
Prova de tristes sabores
E só dribla as tristes sinas
Com as canções nordestinas
Na voz de nossos cantores.
PP - Desta forma eu imagino
Como a saudade é gigante
De quem curte uma saudade
Do chão que ficou distante.
O seu coração se esmaga
Quando escuta de Gonzaga
“A vida do viajante”...
AL - Gonzaga em primeiro plano
Desenhando as melodias
Enquanto as aves celestes
Trazem velhas cantorias
De poetas encantados
Cortando com seus arados
A dor de todos os dias.
PP - Ouvir Gonzaga, distante,
Talvez seja mais gostoso,
Pois a saudade é tempero
Dum coração amoroso.
O mesmo é ler no papel
Em folheto de cordel
O “Pavão misterioso”.
AL - O Pavão é outro esteio
Na vida do retirante.
O seu voo é projetado
No coração do amante.
Passam dias, anos, eras,
Lobisomens, bestas-feras
E ele a voar, brilhante!
PP - Eu te comparo ao pavão,
Porém, sem nenhum mistério,
Que fugiu de sua terra
E foi para outro hemisfério,
Mas que compõe, canta e rima
E além de tudo estima
O poeta, quando sério.
AL - O engenheiro Edmundo,
quem construiu o pavão,
Trazia trancafiado
O signo de Salomão.
Desde o tempo de menino
Que Pedro Paulo Paulino
Tomou com ele a lição.
PP - É um mestre consagrado
Que devemos respeitar,
Construiu o seu pavão
Misterioso no ar...
De modo que hoje em dia
Sem a sua poesia
Não tem quem saiba voar.
AL - A poesia é um porto
Onde abrigo meu navio.
Nas docas guardo meus fardos,
No cais eu me distancio,
Busco outros mares sonhando,
Vejo o pavão flutuando
Por cima do mar bravio.
PP - Eu, que vivo no estio,
Sonhando com chuva à beça,
Ouvindo você falar
De uma coisa linda dessa,
Sinto uma certa opressão
Bem dentro do coração...
Pra chover, faço promessa.
AL - Quando a chuva prometida
É escassa ou demorada
Deixa uma ferida aberta
Cavada por uma enxada.
A terra sangra sem sangue,
Seu coração vira um mangue
De tanto furo de espada.
PP - Poeta, por gentileza,
Conte em sua tabuada
Quantas estrofes fizemos
Nesta noite enluarada.
28 é bom demais,
Mas se precisar de mais,
Vamos varar madrugada.
AL - São trinta e uma as estrofes
Para fazer o cordel
Sendo quatro em cada página
Quando dobrado o papel.
Três estrofes na primeira,
Capa, grampo, empilhadeira,
Vendido sempre a granel.
PP - Grande poeta, obrigado
Por essas estrofes suas.
Voltaremos a rimar
Outras noites, outras luas...
Pra você, um forte abraço.
Com esta estrofe que faço,
Somam logo trinta e duas.
AL - Agora vamos reler
E fazer adequações:
Se tem algum pé quebrado
Ou quaisquer alterações.
Foi boa a noite rimada
Vendo a lua prateada
Iluminando os sertões.
PP - Releitura é necessária,
Vamos reler, sim senhor.
O meu verso, junto ao seu,
Encontra maior valor.
Eu vou passar pro papel
Estes versos de cordel
Para entregar ao leitor.
♦♦♦
Aderaldo Luciano é poeta, escritor, professor e editor.
Muitas coisas me impressionaram neste cordel: a presença constante de espírito, a brincadeira com os astros, a correção do português, a riqueza das rimas. Magnífico!
ResponderExcluirFlávio Henrique
De uma brincadeira, um caso sério. Rimas ricas de um bom humor refinado! Parabéns Mestre.
ResponderExcluirPretto
Do Mestre Aderaldo e Pedro Paulo, eu espero sempre excelência! Excelência nos versos, excelência na visão do mundo! Que bom ter a oportunidade de lê-los!
ResponderExcluirSilvana Andrade